Como avaliar a percepção do sofrimento da pessoa doente em cuidados paliativos?

17/10/2024

O conceito de sofrimento

O sofrimento, no contexto dos cuidados paliativos, transcende a dimensão física da dor e envolve uma experiência complexa e profundamente subjetiva. De acordo com o Manual de Cuidados Paliativos , o sofrimento possui quatro principais dimensões: aspectos físicos; aspectos socais/familiares; aspectos emocionais/psicológicos e aspectos religiosos/espirituais, manifestando-se de forma única em cada indivíduo.

A percepção do sofrimento está ligada à perda de controle sobre a própria vida, ao medo do desconhecido, à sensação de vulnerabilidade e à incapacidade de se reconectar com a própria identidade e com o significado da existência. Dentro desse cenário, o sofrimento não se limita apenas à condição patológica, mas envolve também o impacto das limitações impostas pela doença e o sofrimento existencial que pode emergir em pacientes que enfrentam a proximidade da morte.

Nos cuidados paliativos, o alívio do sofrimento torna-se o foco central, sendo abordado de maneira integral e personalizada. A equipe multidisciplinar visa não apenas controlar os sintomas físicos, como a dor, mas também prestar atenção aos aspectos emocionais e espirituais, ajudando o paciente e sua família a lidar com o impacto da doença de maneira mais humanizada. O objetivo é promover o conforto e a dignidade, respeitando os desejos e valores do paciente, oferecendo suporte para que ele possa encontrar alívio e paz, mesmo diante de uma condição incurável. Dessa forma, o sofrimento é entendido como uma experiência multidimensional, que demanda uma abordagem compassiva e holística, a fim de minimizar seu impacto e proporcionar qualidade de vida.

O sofrimento, dentro da perspectiva dos cuidados paliativos, não é apenas uma questão médica, mas também uma questão ética e filosófica. A abordagem paliativa reconhece que, embora a cura possa não ser possível, o cuidado nunca deve ser negligenciado. Isso implica em uma relação de empatia e respeito pela autonomia do paciente, garantindo que suas preferências e decisões sejam ouvidas e honradas. Ao aliviar o sofrimento, os profissionais de saúde não apenas tratam o corpo, mas também acolhem o ser humano em sua totalidade, reconhecendo a importância de oferecer um espaço para que ele expresse suas angústias, medos e esperanças.

O Diagrama de Abordagem Multidimensional (DAM) como instrumento de avaliação do sofrimento

O Diagrama de Abordagem Multidimensional (DAM) é um instrumento utilizado para avaliar o sofrimento de forma ampla e integrada, especialmente em contextos de cuidados paliativos. Sua principal finalidade é proporcionar uma compreensão mais completa e detalhada do sofrimento vivenciado pelo paciente, levando em consideração múltiplas dimensões que influenciam sua experiência individual e única. O DAM busca avaliar o sofrimento em várias esferas, como física, emocional, psicológica, social, espiritual e existencial, reconhecendo que cada uma dessas áreas pode contribuir significativamente para o estado geral de bem-estar ou angústia do paciente.

A aplicação do DAM permite que a equipe de saúde obtenha uma visão holística da condição do paciente, identificando não apenas os sintomas físicos, mas também os fatores subjetivos que agravam ou perpetuam o sofrimento. Isso inclui preocupações existenciais, sentimento de perda de dignidade, medos relacionados à morte e ao futuro, além de dificuldades emocionais, como ansiedade e depressão. Ao integrar essas diferentes dimensões em uma avaliação estruturada, o DAM facilita a criação de planos de cuidado personalizados, focados não apenas no alívio de sintomas isolados, mas na promoção de conforto e qualidade de vida de forma integral.

O DAM é formado por 3 circunferências representadas por:

Circunferência menor (vermelha): Representada pelos dados concretos acerca do quadro clínico do paciente, sua trajetória de vida, identificação da sua rede de apoio, religião que pratica, entre outras informações para compreender e compor a sua ficha técnica.

Circunferência intermediária (verde): Representada pelos tipos de conflitos e desafios que podem causar sofrimento ao paciente, desde aspectos pessoais, familiares, religiosos e econômicos.

Circunferência externa (laranja): Representa as estratégias que serão adotadas pela equipe multidisciplinar para intervir em prol da diminuição do sofrimento, diante dos aspectos que foram apresentados.

A percepção de sofrimento do paciente

O estudo supracitado, diante de uma coping review, aponta para uma análise de estudos com prevalência de uma percepção holística do sofrimento dos pacientes, onde será apresentado as dimensões da percepção de sofrimento mais relevantes:

A sobrecarga  autopercebida: a sobrecarga se mostrou, em diversos estudos, muito relevante pelo aumento do desejo de morte de pacientes em sofrimento, pois correlaciona o  relacionamento sócio-relacional  e  do  sofrimento  existencial.

A perceção de representar um fardo: o sofrimento socio-relacional gera a autoculpabilização, e apresenta diminuição da vontade de continuar vivendo.

A percepção de perda  de  controle: a perda de controle está diretamente relacionada com a perda de papéis sociais, onde o paciente se sente sem o direito de fazer escolhas livres, e também não se vê como útil para a dinâmica familiar, o que promove uma alta percepção de sofrimento. Essa percepção também pode causar sentimento de impotência e despersonalização.

A solidão: o sentimento de solidão possui uma percepção de sofrimento em diversos âmbitos, tanto pessoais, relacionais e espirituais, sendo que os estudos apontam para a percepção de solidão física e moral.

A importância da comunicação compassiva

A comunicação compassiva é um elemento central no cuidado de pacientes, especialmente em contextos de doenças graves ou terminais. Mais do que a simples transmissão de informações, ela envolve uma escuta atenta e empática, que respeita as emoções e preocupações do paciente e de sua família.

A comunicação compassiva exige dos profissionais de saúde a capacidade de acolher, validar e responder de forma sensível aos medos, dúvidas e angústias que surgem ao longo da trajetória da doença. Ao estabelecer uma comunicação cuidadosa, é possível construir uma relação de confiança e segurança, elementos fundamentais para o bem-estar emocional do paciente.

A prática da comunicação compassiva não se resume a evitar palavras que possam causar medo ou angústia, mas também em reconhecer o momento e a forma correta de abordar temas delicados, como o prognóstico ou a limitação dos tratamentos. Ela implica na disposição do profissional em estar presente, tanto no nível cognitivo quanto emocional, oferecendo apoio e consolo em situações que, muitas vezes, estão marcadas pela incerteza e pelo sofrimento. A comunicação clara, aliada ao respeito e à escuta ativa, auxilia o paciente a sentir-se compreendido e, acima de tudo, amparado, o que pode reduzir a sensação de isolamento e vulnerabilidade.

Além de ser uma ferramenta de cuidado centrada no paciente, a comunicação compassiva também envolve a família e os cuidadores, que frequentemente enfrentam grande sofrimento emocional. Ao incluir essas pessoas no processo de comunicação de forma sensível e cuidadosa, os profissionais de saúde podem ajudá-las a lidar com o impacto emocional da doença, oferecer suporte nas decisões de cuidado e promover um ambiente de suporte mútuo. Dessa forma, a comunicação compassiva torna-se um pilar não só para o alívio do sofrimento, mas também para o fortalecimento das relações interpessoais durante momentos de vulnerabilidade, possibilitando um cuidado mais humanizado e integral.

Venha conhecer o trabalho do Revitare com os cuidados paliativos

Acompanhe nas nossas redes sociais o nosso trabalho, e no nosso blog as matérias semanais sobre diferentes temas da área de cuidados em saúde. E não perca a chance, caso seja ou esteja de passagem por Campinas, de realizar uma visita e conhecer o nosso espaço!